Autor: Nordestinados a Ler

Nas ondas da Literatura
Literatura

Nas ondas da Literatura

Luciana Bessa Há dois anos, O Blog Literário Nordestinados a Ler foi convidado por FranciscoNascimento para fazer um programa na Web Rádio Cafundó, cuja programação évoltada para o fortalecimento da cultura e dos movimentos sociais, assim comopara os Direitos Humanos. Confesso que minha primeira reação foi perguntar: “Como assim?”, “Falarsobre Literatura em uma rádio?”. Esse estranhamento se deu, porque sou deuma geração que escutava rádio com uma fita cassete na mão, pronta paragravar músicas em inglês com a tradução do locutor. Nunca escutei um programa de rádio que tivesse a literatura como foco. Mascomo sou movida a desafios, já dizia Sócrates “Uma vida sem desafios nãovale a pena ser vivida”, aceitei a provocação literária, afinal, o poeta gaucheCarlos Drummond de Andrade ens...
Nem uma vez uma voz humana
Literatura

Nem uma vez uma voz humana

Luciana Bessa Nove contos, nove vozes de mulheres integram a obra Nem uma vez uma voz humana, da escritora paraibana Débora Gil Pantaleão. Cada texto segue o fluxo da consciência e olha para o interior de cada uma das personagens submetidas a diferentes tipos de violência. Com a capa de Ícaro Medeiros, uma epígrafe de Samuel Beckett (de onde foi retirado o título do livro), um prefácio de Lucimar Bello, a autora nos apresenta uma escrita cortante sobre mulheres que vivem situações tensas e densas. No primeiro conto “Janela Abaixo”, a narradora conta-nos como foi seu dia. Uma temática comum se não fosse por um detalhe: “Detestava crianças. Não sei como consegui ser uma” (p. 17). Depois de dez anos de casada, Daniel, o marido, a convenceu a engravidar. A princípio ela acreditou q...
The Last Of Us
Literatura

The Last Of Us

Renato Mendes New the Walking Dead? Surfando na onda de séries pós apocalípticas, que ganharam ainda mais força no cenário pandêmico, a HBO acertou na produção de The Last Of Us. No entanto, a série é bem difícil de ser comparada a outras do gênero. The Walking Dead, por exemplo, é semelhante por também ter uma versão como jogo, só que é menos conceitual, os infectados têm mais protagonismo e são mais violentos. A morte de Tess (Merle Dandridge) é um bom exemplo, quando encurralada pelos “zumbis”, eles não a mordem todos de uma vez, como aconteceria no produto da AMC, mas apenas um infectado deixa os esporos entrar pacificamente pela boca dela. Grosseiramente, há pouquíssimas semelhanças entre as duas produções. Fazendo o comparativo entre as duas, um elogio a HBO foi mostrar a or...
Close: um filme para sentir
Literatura

Close: um filme para sentir

Renato Mendes Close é um drama belga no estilo coming of age, ou seja, está voltado para o período da juventude e seus dramas. Dirigido e roteirizado por Lukas Dhont, o longa-metragem é baseado em suas histórias pessoais. O trabalho é o segundo grande sucesso do diretor, tendo lançado Grill em 2018. O filme conseguiu me transpor para a cena, graças a trilha sonora e o movimento de câmera. Começa com Remir (Gustav De Waele) e o seu melhor amigo Leo (Eden Dambrine) brincando em uma fortaleza criada em suas imaginações. Em seguida, os dois correm por um lindo campo de rosas, enquanto no segundo plano são apresentados outros personagens da história. Nesse início há a sensação de uma infância ingênua, sendo logo evidenciado a relação de proximidade dos personagens. A principal caracter...
Ela existe
Literatura

Ela existe

Alexandre Lucas* Xela é uma das dessas incompreensões que estão na nossa trivialidade. É desacerto.  É rosário de contas doloridas.  É chá, café e fogo. É contradição. É mastigado de interrogações. É um monte de gente. É dança, pacto de esperança. É à beira da morte.     É uma linguagem curta, crua e forte. Pouco açúcar. É panfleto, manifesto, desaforo. É purpurina. É retalhos de Frida e Maiakovski.   Redemoinho, fragmento e lamento. Xela é o   bolo que acabou, a casa vazia, o terremoto na barriga. O silêncio gritante, a roseira vermelha e o Diário de Anne.   É uma tempestade de palavras vomitadas. A escrita fisgada da varanda e do intestino. É ventre parido da realidade.  Hora e outra é possível tropeçar na poesia e s...
Futebol é coisa de mulher!
Literatura

Futebol é coisa de mulher!

Shirley Pinheiro “Tá na hora tem copa do mundo pra gente jogar E nossa seleção feminina vai representar Tá na hora de a gente se unir, de torcer e cantar numa única só voz Que é pra nossas meninas trazerem a tão esperada estrela pra nós” (Gabi Fernandes — Meninas de Ouro) Hoje, finalmente, a Seleção Brasileira estreou na Copa do Mundo Feminina da FIFA. E o resultado, contra o Panamá, como já era esperado, foi positivo para nossas jogadoras. Com um time totalmente focado, preparado, estruturado e, principalmente, decidido a trazer a primeira vitória do Mundial para o Brasil, a Seleção, esse ano, tem um desejo especial, dar o título de campeã do mundo à sua maior estrela, aquela que, orgulhosamente, chamamos de “Rainha”, a Marta. Aos 37 anos, nossa Rainha protagoniza ago...
O diário da rua
Literatura

O diário da rua

Alexandre Lucas* Água de cocô, suco de cajá, café, mistura da tarde. Pernas cruzadas. Praça. Leio um diário, comicamente dolorido, entre uma página e outra, bisbilhotando a vida alheia. Anônimos e conhecidos passam. Poderia ler no sossego de casa, prefiro a rua. Sinto-me acompanhada pelo menos de distrações. Consigo devorar mais páginas, parece contraditório, mas apenas serve para constatar que não existe uma forma única para encarar a realidade, ainda bem. Leio mais um pouco. A dona do diário reclama da convivência e do enclausuramento. Todos socados em uma mesma casa, sem poder sair, os nervos pincelados com ácido. Na rua visualizo outros diários. As pessoas não se percebem, saem escrevendo parte do seu dia. O homem sentado no banco da praça não consegue controlar suas mãos q...
Jovelina:  uma Pérola Negra do samba
Literatura

Jovelina: uma Pérola Negra do samba

Luciana Bessa Durante décadas, as mulheres não tiveram vez/voz no samba, já que o palco e os holofotes eram dominados pelos homens. Às mulheres cabiam o papel de musa ou de intérpretes. No entanto, com suas posturas questionadoras e versos atemporais, elas preencheram esse gênero musical, símbolo da cultura e da identidade do povo brasileiro. Jovelina Farias Belfort, integrante da Ala das Baianas do Império Serrano, parecia ter música correndo em suas veias. Era frequentadora assídua das Rodas do Botequim da Escola da Serrinha, do Pagode da Tamarineira, no Cacique de Ramos. Estamos diante de uma dessas mulheres sambistas, trabalhadoras, corajosas e ousadas, que usou sua voz para falar de amor, e dos problemas de seu país, especialmente, o racismo. Cantora e compositora, Joveli...
Meus amigos
Literatura

Meus amigos

Micael Sousa Não sou triste, tenho amigosQue são amigosTão amigos quanto abrigosQue me trazem boas novasE dissipam as ruinsÉ assimEu por elesEles por mim Não sou triste, tenho amigosAmigos que são cativantesAlmas esperançosasDiferentes e vibrantesJá não choro como ontemNem reclamo com antes
Foram apenas os cachos
Literatura

Foram apenas os cachos

Alexandre Lucas* Raspa tudo. A máquina derrubou os cachos, as lágrimas quase caíram. Nada mudou.  Os dilemas ainda permanecem os mesmos. Os cabelos crescem, espero que os problemas diminuam. Manhã de domingo, as crianças brincam entre as pedras e a água. Observo, enquanto mastigo algumas sementes de girassóis e aprecio a simetria das margaridas. Sinto-me com a cabeça mais leve. Falta-me cachos, sou a mesma, talvez disfarçada.  Os cachos são só aparência. As crianças continuam brincando:  algumas têm cachos, outras sorrisos. Tento reencontrar alguma coisa, talvez tenha perdido alguma criança que restava dentro de mim. Hora de partir. Aqui é gostoso, ando só. Vejo as árvores se espreguiçando, mas estão presas não podem me seguir. Outra hora volto, talvez já tenha c...